O dia começou a trovejar e as nuvens prenunciavam fortes chuvas e, com minha bengala surrada pelo tempo, fui subindo paulatinamente uma pequena escada que dava no andar de cima da nossa casa que ficava num bairro nobre da cidade, a fim de fechar a janela do escritório dele.
Minha amiga ajudante, nesse dia ia atrasar um pouco, deixando-me só com meus pensamentos.Há quinze anos que ele partiu para o infinito e no seu escritório tudo está no mesmo lugar.
Quando Rosária, minha minha ajudante e amiga ia limpar o escritório de Levi, lá estava eu para fazer alguns detalhes que só eu, como esposa solitária podia fazer. Sentir o cheiro da saudade e do amor.
Ela limpava com cuidado, não tirando nada do lugar, só a água era trocada todos os dias, enquanto ela arrumava o escritório eu sentava em sua cadeira de balanço para ler as lindas cartas que escrevia semanalmente para mim, desde o dia em que nos conhecemos há cinquenta anos.A cada ano que passava suas cartas eram mais delicadas e perfumadas com o perfume da saudade. Deixava cair algumas lágrimas e com isso elas ficavam cada dia mais difíceis de ler. Mas não era preciso lê-las, já as sabia de cor.
Quando vivo, enquanto ele escrevia seus contos e poesias, eu balançava e, de ponto em ponto à tricotar seu novo suéter. Fazia frio. Estão todos guardados num baú que procuro não abrir muito, só quando meu coração dói de saudades, abro-o rapidamente e ali está impregnado o seu cheiro, o cheiro do meu poeta apaixonado. Fecho-o rapidamente, viajo meu olhar em todos os seus pertences e uma lágrima mais doída corre meu rosto, fazendo poças nos sulcos do meu rosto, que deixo secá-las naturalmente.
Seu livro de rascunho velho e amarelado com o tempo escondem os nossos segredos de amor. Quanta luxúria em forma de estrofes estão grudadas naquelas páginas que só nós dois lemos e deverá ser incinerado no dia em que eu for encontra-me com ele.
Oh! Levi, sinto que o tempo está encurtando nosso encontro e meu coração, já velho de saudades, anseia esse encontro.
Levi, a vida é vazia sem você, nunca deixei de amá-lo.
Dorli Silva Ramos